quinta-feira, junho 29, 2017

MACACOS, SOMOS TODOS!

KONG: ILHA DA CAVEIRA - Créditos completos

Com exceção da simpática chimpanzé Chita, que acompanha Tarzan, o gorila King Kong deve ser o mais famoso macaco de Hollywood, sendo dono e senhor de uma coleção de filmes que começou em 1933 com o original de Merian C. Cooper e Ernest Schoedsack, protagonizado pela formosa Fay Wray, objeto da paixão do gigante primata. A última tentativa que me recordo, para já, foi o "King Kong" de Peter Jackson, que não tendo onde gastar o dinheiro que "O Senhor dos Anéis" lhe deu a ganhar, decidiu esbanjar uns dólares num remake espalhafatoso, mas vulgar.


Uma lista proposta pelo site IMDb contém 18 filmes acerca do gorila King Kong, mas não garanto que esteja exaustivamente completa. Está lá este "Kong: Skull Island", que, para já, é o que nos interessa aqui. E a pergunta que toda a gente se coloca é: vale a pena perder tempo com mais um gorila gigante, mesmo considerando que a evolução dos efeitos especiais entre 1933 e 2017, nos pode proporcionar macacos mais convincentes?


Quase todos os argumentos dos variados King Kong começam da mesma maneira: um grupo de cientistas explora uma ilha perdida. Depois a aventura vai variando de ponto de vista, conforme cada realizador quer dar um certo cunho original à "sua" história - os cientistas de Jackson foram transformados numa equipa de cineastas, por exemplo -, mas no fundo - e nem é preciso ir muito "fundo"! - todos os filmes são iguais e acerca da mesma coisa: um gorila gigante que se apaixona por uma bela donzela, que por um motivo ou outro, anda perdida no meio do grupo.


Este "Kong: Skull Island" começa com as premissas do costume: cientistas falidos à procura de dinheiro para uma expedição a uma ilha desconhecida no Pacifico. Mete militares em comissão no Vietnam, na época em que Nixon decidiu acabar com a guerra. Combatentes deprimidos por já não haver inimigos em quem descarregar tiros. É o ponto de vista "original" de Dan Gilro, Max Borenstein, Derek Connolly e John Gatins, os argumentistas desta versão realizada por Jordan Vogt-Roberts, um ilustre desconhecido que tem no currículo uma série de curtas e episódios para a TV.
 
  

A primeira impressão é que a nossa estadia no cinema não vai correr nada bem, isto apesar da presença de atores consagrados como Samuel L. Jackson ou John Goodman - de quem eu gosto particularmente. É verdade. "Kong: Skull Island" é mais um subproduto de Hollywood, embrulhado em efeitos especiais de primeira água, mas sem recheio que lhe dê algum sabor. É um "tiro neles" vulgar, em que o inimigo é o gorila gigante mais famoso do cinema. Nada mais.






Vogt-Roberts consegue imprimir um ritmo interessante ao filme e isso vai mantendo o espetador colado ao ecrã. O filme quase não tem tempos mortos, o que não deixa de ser um ponto a favor, mas também não tem nada mais. É uma sucessão de vulgaridades, entre tiros e pancadaria. Se não tiverem nada para fazer, esta hora e meia não vai aborrecer, mas para os mais exigentes, também não vai acrescentar seja o que for; não é uma película que irão recordar para contar aos netos.

Com muitos planos que metem helicópteros e por-do-sol, muitos irão ter pequenas visões da famosa cena de "Apocalypse Now", sem Wagner mas com Black Sabbath. Até um dos personagens se chama Conrad (Tom Hiddleston), quase a fazer lembrar o autor de "Coração das Trevas". Só que em vez de entusiasmar, esta comparação só serve para destroçar ainda mais o coração dos cinéfilos mais exigentes.



segunda-feira, junho 19, 2017

O FUTURO É HOJE

CRÉDITOS COMPLETOS

Mateo Gil é co-argumentista de "Abre Los Ojos" - o original do qual "Vanilla Sky" é uma pálida imagem -, um dos mais fantásticos romances que nos pode ser dado assistir. Este "Realive" (ou "Proyecto Lázaru") vai buscar muito do fascínio do primeiro, na forma como explora a angústia da vida humana, frágil e dramática, mas acrescenta-lhe a própria direção de Mateo, tão seguro atrás das câmaras como na escrita de histórias.


Talvez este "Realive" tenha mais a ver com "Mar Adentro" (outro co-argumento de Mateo Gil), no sentido em que procura projetar a vida para além das possibilidades físicas do corpo, quer dizer, existe realmente um espírito que pode permanecer vivo, depois da degradação material da carne? Ao contrário do Ramón Sampedro de "Mar Adentro", este Marc Jarvis (Tom Hughes) quer, pelo contrário, prolongar a vida além da morte, o que - à primeira vista, e só à primeira vista - o coloca nos antípodas do paraplégico Ramón, que se quer suicidar.

A história do filme pode ser resumida com facilidade: depois de ser diagnosticado com uma doença grave, Marc Jarvis decide congelar-se para num futuro, próximo ou não, poder ser reanimado numa época em que haja cura para o seu mal. Para trás fica a grande paixão da sua vida, Naomi (Oona Chaplin), que sem ninguém o suspeitar, toma uma importante decisão.


Dito assim, parece um enorme dejà vu e até pode afastar alguns espetadores mais desconfiados. Mas a realidade é que o filme apresenta-nos um drama que ultrapassa em muito o cliché do "viver para sempre", ideia que desaparecerá muito depressa da cabeça de alguns, depois de assistirem a "Realive". Quem quer viver para sempre? Ou, dito de outra forma, a eternidade valerá realmente a pena, se as memórias nos colocarem exatamente no momento em que já não podemos estar nunca mais?


Mateo Gil é um argumentista dum talento ímpar, e até pode ser que a sua realização não consiga captar a profundidade da história. Talvez... Mas a verdade é que "Realive" deve ser um dos melhores filmes de ficção científica ou um dos melhores romances - cada um que decida por si -, dos últimos tempos. Uma viagem entre um laboratório que é uma obra-prima da ciência médica de 2084 e uma casa à beira mar (o filme não indica onde, mas pode ser qualquer cidade costeira, tipo Los Angeles) de 2015.


"Realive" pode partir de uma premissa simples: em principio, todos nós desejaríamos viver para sempre. No entanto, desconstrói o problema da eternidade de tal forma, levando o desespero duma existência sem momentos concretos ao limite do insuportável. No final, os espetadores mais atentos, ou mais sensíveis a estes problemas do "tempo" e da "morte", vão agradecer por a vida ser efémera e a eternidade ser impossível.


Este filme não tem momentos de suspense tradicionais, não tem aventuras amorosas tal como as entendemos no cinema habitual. É apenas a história de um personagem que rejeita a imortalidade, que pensou desejar antes de a possuir. Tão simples quanto isso. E não é preciso nada mais, para fazer um drama interessante, uma história de vai prender a plateia ao ecrã até ao fim.

sábado, junho 10, 2017

O REGRESSO DE "SHANE" NO ADEUS A MISTER HUGH

Logan: CRÉDITOS COMPLETOS



Wolverine deve ser o mais amado dos personagens de X-Men e como Hugh Jackman já afirmou várias vezes que deixaria para trás o personagem da Marvel - coisa que, como sabemos, a maior parte das vezes depende muito da quantidade de dólares que lhe oferecerem pelo regresso -, este "Logan" merece bem uma crónica neste blog, principalmente porque ele é parte integrante de uma série que começou em 2000 e que, melhor ou pior, tem mantido um nível muito acima da média.


"Logan" assume uma dimensão de ficção cientifica que não era tão visível nos filmes anteriores, o que vai chamar algum público que nunca se sentiu atraído pela série propriamente dita. O filme assenta arraiais explicitamente no futuro, coisa que não sendo estranha para os amantes dos filmes anteriores, sempre foi deixado um bocado no ar, apenas como um pressuposto que não precisa de ser esclarecido.


Esta distância no tempo é acentuada pela constante presença de "Shane", o filme de 1953 de George Stevens, considerado por muitos um dos melhores westerns de sempre. "Shane" não aparece em "Logan" apenas como uma peça secundária, mas como um personagem distante que o diálogo final de Shane com Sam vem acentuar para "memória futura". Toda a história deste "Logan" - o herói que não o quer ser -, pode ser resumida em "Shane" - o cow-boy que não quer usar armas.


Desde o inicio da série que Logan é um desenquadrado, não se sentindo à vontade com o grupo X-Men, mas não se encaixando numa vida social tradicional, quer dizer, não está bem dentro e não está bem fora. Isso não muda neste capítulo. Afinal, esse também é um dos fascínios que atrai tantos admiradores para este personagem, uma espécie de Nietzsche dos mutantes, um homem que quer novos valores num mundo contaminado por uma tradição que não lhe diz respeito, da qual se sente excluído.



Eu sou um incondicional admirador da série X-Men em geral, e por Hugh Jackman no papel de Wolverine em particular, e tenho uma leve impressão que esta é a melhor performance do ator na pele deste mutilado deprimido. Embora por vezes o filme pareça cair numa toada algo lamechas, puxando a lágrima do espetador, isso parece-me que se deve mais a presença de Laura (Dafne Keen) do que a uma intenção deliberada do realizador e co-argumentista, com Scoll Frank, James Mangold - que já tinha pegado no mesmo personagem em 2013, com o filme "Wolverine".


Como de costume, Wolverine é empurrado para a aventura quase contra vontade, neste caso por uma Laura infantil mas nada inocente, uma verdadeira máquina de matar. Talvez "Logan" seja o capítulo final para Hugh Jackman como Wolverine e para Patrick Stewart como Professor X, mas ficaram muitos mutantes à solta para Hollywood e a Marvel encerrarem uma das séries de maior sucesso baseadas em comics. Ainda há pana para mangas a explorar.


Os fãs da série não se sentirão desiludidos por este final - o filme tem tudo o que faz da série X-Men o sucesso que sabemos - e, ao mesmo tempo, não deixará indiferentes um novo público, ao qual se parece começar a piscar o olho. No fundo, pode não passar de uma sequela dos outros "solos" de Wolverine - o de 2003 "X-Men Origens: Wolferine" e o já citado "Wolverine" de 2013 -, mas se for esse o caso, este "Logan" é o melhor dos três.