sábado, março 24, 2018

VEZES ZERO, IGUAL A ZERO

CRÉDITOIS COMPLETOS

Eu não desgosto de Nicolas Cage. um actor muito subvalorizado e com mau gosto para escolher projectos, mas que tem no currículo algumas obras brilhantes como "Rumble Fish" ou "Morrer em Las Vegas"; também não desgosto de Robin Tunney, a bela Teresa Lisbon de "O Mentalista", actriz profícua em series de TV. Quanto ao realizador Tim Hunter - homem especializado em televisão -, não deixa de ser sempre uma incógnita quando se trata de longas metragens, mas que já dirigiu o desconcertante e injustamente ignorado "River's Edge".


Dito isto, resta acrescentar que "Looking Glass" é como uma multiplicação por zero: dá zero. É um filme que não tem sentido, não tem ritmo, não tem direcção. E embora não carregue nos ombros más interpretações, os actores estão ali como se não estivessem. A história está mais que vista - lembram-se de "Os Outros" de Alejandro Amenábar? -, mas neste caso e a multiplicar a isso, não tem ponta por onde se lhe pegue, não tem interesse, não tem suspense, é um resultado absolutamente nulo.


O casal Ray (Nicolas Cage) e Maggie (Robin Tunney) adquirem um motel no deserto, aonde acabam envolvidos em misteriosos acontecimentos, remanescentes de antigas ocorrências no local. Nada de novo, o que não impediu Nicole Kidman de arrasar em "Os Outros" ou o casal Kate Backinsale e Luke Wilson de assustar plateias em "O Motel". O problema de "Looking Glass" não é sequer a repetição, mas a ausência total de qualquer coisa.


Este filme desperdiça o talento do elenco num argumento completamente vazio, preenchido com os piores clichés do género, que vai repetindo cena após cena. A determinado ponto, parece que toda a plateia suspira de desespero, gritando em silêncio "mais não, mais não!...", tal é a saturação de zeros seguidos de zeros ad infinitum.


"Looking Glass" vem classificado um thriller psico-sexual. É uma mentira porque não tem nada que se possa comparar seja ao que for, para poder ser rotulado seja do que for. Na verdade "Looking Glass" é um mero desperdício de tempo para o espectador, para dizer o mínimo, principalmente para aqueles que gostam de thrillers, sejam eles psico-sexuais ou não. Quando o filme acaba, a plateia sai do cinema como uma simples multiplicação por zero: com um resultado igual a zero.

quarta-feira, março 14, 2018

COMPETÊNCIA ENTRE INFANTILIDADES

Aniquilação: CRÉDITOS COMPLETOS

"Annihilation" é a segunda incursão de Alex Garland na realização, depois do surpreendente "Ex Machina", mas na realidade é apenas mais um na longa lista de adaptações de novelas, coisa que ele sabe fazer melhor que ninguém, como se percebe pelo fantástico "Nunca Me Deixes". Este é um daqueles filmes que vão deixar alguns espectadores sem saber o que pensar: tem tantas qualidades como defeitos, um conjunto agradável, formado a partir de pormenores às vezes desadequados.


A ver se me explico: começa por parecer um "teoria da conspiração", passa a piscar o olho a um "tiro neles", toma ares de ficção cientifica e acaba por ficar muito mais próximo de "Stalker" de Andrei Tarkovsky do que de qualquer outra coisa que já tenhamos visto até agora. Em certos momentos parece o "Predador" para intelectuais, noutros momentos é misterioso como "2001: Odisseia No Espaço". Tem tantos pozinhos do "Alien 2" de James Cameron como de "A Origem" de Christopher Nolan.


Apesar de muitos pormenores desadequados - como ter demasiadas metralhadores e diálogos por vezes infantis -, "Annihilation" é um filme que se segue com interesse, envolve um mistério que o espectador não deixa de querer resolver e é alimentado por um conjunto de interpretações que, não sendo brilhantes - ou, se quiserem, ficam aquém do que sabemos ser possível, porque já vimos noutras ocasiões -, não desiludem ninguém.


Um grupo de cientistas - numa expedição secreta - penetra numa "zona", na busca duma explicação para o mistério que a envolve, depois de vários grupos militares terem desaparecido em tentativas semelhantes. E embora o conjunto cientifico seja formado apenas por mulheres, este não é um filme feminino no sentido literal do termo, já que o género é indiferente para o desenrolar da acção.


"Annihilation" está longe de ser o melhor filme do mundo, mas entre mutações genéticas e animais sanguinários, Alex Garland vai construindo um filme misterioso, com ritmo e desenvoltura, que a plateia não tem qualquer dificuldade em seguir com interesse, mesmo que em certos momentos sorria por dentro com algumas infantilidades. Nestas tardes frias e tempestuosas, uma sala de cinema com obras como esta, parece o Paraíso.

sexta-feira, março 09, 2018

A VIOLÊNCIA PODE SER UMA PIADA

Três Cartazes à Beira da Estrada: CRÉDITOS COMPLETOS

A imagem de Frances McDormand vai estar sempre colada à da policia Marge, que entre rios de sangue e selos de correio, soluciona o mistério de "Fargo", escrito e realizado pelo marido Joel Cohen e pelo cunhado Ethan Cohen - que, aliás, já a tinham dirigido noutra maravilha dos irmãos: "Sangue por Sangue".


E a imagem de "Fargo" nem sequer é inocente neste "Three Billboards Outside Ebbing, Missouri", nem o registo de Frances McDormand é assim tão diferente. Ambos são comédias negras duma violência atroz, embora no primeiro ela possa ser mais explicita que aqui, onde a tensão é latente, mais pressentida que visual. No entanto, ambos são aquele género de filmes em que o espectador se irá perguntar se esteve a ver um policial sanguinário ou uma comédia, quando, na verdade, esteve a ver ambos.


A filha de Mildred (Frances McDormand) é violada e assassinada - não necessariamente por esta ordem, segundo se dá a entender - e revoltada com a inoperacionalidade da policia local, a mãe decide colocar à beira da estrada de entrada na cidade, três outdoors de provocação às autoridades. Sendo uma localidade da América sulista profunda, com o seu conservadorismo e tradições enraizadas, esta acção vai provocar uma sucessão de acontecimentos trágico-cómicos, que levarão a consequências violentas e imprevisíveis.


Embora Frances McDormand seja a estrela maior da companhia, a verdade é que é auxiliada por um elenco de tal forma brilhante, que o filme se torna uma exibição de talento na arte de representar: Caleb Landry Jones (o filho), Woody Harrelson (o chefe da policia), Zeljko Ivanek (o sargento), todos eles formam um elenco exemplar, levando o realizador e argumentista Martin McDonagh ao êxtase.


Não se pode dizer que eu tenha entrado no cinema completamente às cegas para ver este filme, mas a verdade é que também não estava à espera de tal brilhantismo, no desenvolvimento do argumento, no requinte do humor negro, na tensão latente e num final onde a solução do crime é o menos importante, contrariando todos os clichés do género. O filme conjuga um aglomerado de elementos brilhantes, colocados em conjunto entre si de forma a fazer todo o sentido em conjunto.


Enquanto candidato aos Óscars da Academia de Hollywood, e colocado lado a lado com "A Forma da Água" - que, como sabem, adorei! -, podemos dizer de o júri tem um problema: ao contrário de outros anos em que há um nítido vencedor ou, por outro lado, não há nenhum que devesse ganhar, este ano estamos perante duas obras tão diferentes quanto brilhantes.