segunda-feira, outubro 19, 2020

O DRAMA DA FALTA DE COMPROMISSO

A Balada de Adam Henry: ELENCO COMPLETO

 


O que vou escrever a seguir, necessita que eu comece pelo fim: Fiona Maye (Emma Thompson), uma juíza do Supreme Court, está a ver o seu casamento com Jack (Stanley Tucci) desmoronar-se. Ao mesmo tempo, é chamada a decidir sobre um caso que opõe um hospital e os pais de um jovem (Fionn Whitehead) que recusam, por motivos religiosos, uma transfusão de sangue que lhe pode salvar a vida. O argumento é escrito por Ian McEwan, basedo no seu próprio livro - que eu não li, portanto não vou emitir opinião.

Vamos então ao que interessa: não é segredo para ninguém a minha admiração pelo cinema inglês. "The Children Act" não foge à regra. Servido por actores brilhantes, uma "mise-en-scène" perfeita, uma reconstrução cuidada dos ambientes e das situações, este filme tinha tudo para ser o drama de todos os dramas. Devia chamar o espectador a comprometer-se, devia explorar o assunto até à exaustão. Mas não o faz, e acaba por tornar-se um balão vazio.

Podia ser um grande filme a todos os títulos, até porque o realizador Richar Eyre - o mesmo de "Iris", por exemplo -, não estraga o que tem à mão. Aproveita o que de melhor os actores lha dão, retrata a história com sobriedade e leva o espectador com cuidado e sensibilidade. Não é por falta de competência que a coisa falha. É mesmo por querer fugir ao tema.

A vida de Fiona é dirigida com a mesma precisão com que dita leis no tribunal. A sua relação com o marido desfaz-se por falta de humanidade. "The Children Act" podia ser um grande drama romântico, mas o argumento parece fugir ao tema, a vida privada da juíza é tratada de forma tão superficial, que o próprio espectador parece ficar de fora do assunto, que, afinal, é um dos temas centrais. Poderá ela mudar a sua atitude em relação a Jack? Será ele capás de suportar as privações, devido à frieza e (aparente) desinteresse da esposa?

O filme podia também ser um excelente drama moral. Os argumentos de ambas as partes - quer do hospital, quer dos pais de Adam -, levantam questões importantes sobre a Lei, a Ética e a Fé. Mas, mais uma vez, o filme recusa-se a comprometer-se. Deixa o assunto nas mãos da juíza e parece que o assunto começa e acaba aí. Nunca o espectador é chamado a tomar posição e o tema acaba tão depressa como começa. Não há questões sobre a autoridade do Direito, da Religião ou da parentalidade. Nada é problematizado, apesar da urgência do tema. 

Apesar de ser agradável de ver, bem filmado e com ritmo, bem interpretado, tecnicamente competente, "The Children Act" é uma obra inócua, no sentido em que tudo não passa dum embrulho bonito, mas sem nada dentro. Não é um filme de tribunal - onde a legalidade da ciência sobre a fé podia ser esgrimida -, não é um drama - onde a relação de Fiona com Jack podia ser explorada. Não é nada e, afinal, tem todos os ingredientes para ser tudo.