terça-feira, janeiro 03, 2017

SABOR AGRI-DOCE

 


"Nocturnal Animals" vai certamente deixar um sabor estranho na boca de muitos espetadores. Primeiro, é um filme visualmente cuidado, ou não tivesse Tom Ford começado por ser estilista de roupa; segundo, é um filme duma extrema violência, explicita e implícita, o que faz com que nunca saibamos se é um romance, um thriller, um drama psicológico... Ainda porque contêm várias histórias dentro da história, sem nunca parecer querer evidenciar nenhuma.


O filme conta com a participação dum elenco de luxo, mas principalmente conta com a fascinante meio-loura-meio-ruiva Amy Adams (Susan Morrow, a depositária da novela central), que espalha uma beleza ofuscante por toda a película.


A sequência do gato e do rato na autoestrada é excelente, tensa e dramática, o que prova que Tom Ford sabe filmar acção quando quer, isto apesar de todo o filme ter tendência para ser densamente inativo, mesmo que, como já disse, faça uso duma violência invulgar. Uma (um várias) fábula(s) sobre o amor, a vingânça e a linha que separa a vida e a morte. Enquanto Susan Morrow lê, Tony Hastings (Jake Gyllemhaal) - que também pode ser Edward Sheffield, o ex-marido da própria leitora Susan - desespera, sangra, literal e metaforicamente.



Vencedor do Prémio do Júri em Veneza, "Nocturnal Animals" é um thriller psicológico, ou um drama romântico? Não sei. Mas sei que é portador duma tensão arrebatadora, que explora a ténue linha que separa o amor do ódio, a vingança da crueldade, a perdição da salvação. É um filme sobre a descoberta de verdades escondidas, aquelas que todos nós queremos manter ocultas no mais fundo de nós próprios.


Não vai ser um filme consensual. Muitos vão achá-lo doce, outros amargo; muitos, simplesmente, não vão aceitar que um desenhador de moda, muito preocupado com o estilo, seja capaz de fazer uma obra intensa. De qualquer maneira, é uma película que tem de ser vista por quem gosta de cinema, puro e simples, feito com cuidado e com versatilidade - que vai, precisamente, do sal ao açúcar, do amor ao ódio.

RENDER O INVESTIMENTO

 

Tenho a confessar que gostei do primeiro "Jack Reacher". Era um "teoria da conspiração" bem conseguido, com ritmo, acção e divertimento, mesmo considerando que o Jack Reacher de Lee Child tem quase 2 metros de altura e 110 quilos de peso, coisa que o coitado do Tom Cruise, por muito que tente, não consegue atingir, mas mesmo assim, o filme estava bem conseguido.


O problema é que a Paramount adquiriu os direitos de algumas das histórias e agora tem de despachar filmes para compensar o investimento. E se é verdade que Tom Cruise sabe todo o livro da ação - aprendeu a conduzir F-11's e Chevrolets e, reconheçamos, as "Missões Impossíveis" nem são nada de deitar fora -, também é verdade que nem sempre as mãos que o dirigem estão à altura da encomenda.


A adaptação para cinema deste "Jack Reacher: Never Go Back", ficou a cargo de Richard Wenk, Edward Zwick e Marshall Herskovitz, que nem por sombras conseguem atingir o nível do seu antecessor de 2012.
 Este também tem lá (quase) tudo: tiros, porrada, correrias, mas o resultado final é uma omelete sem sal. Não basta por toda a gente aos murros, para fazer um bom filme de ação. É preciso mais.


Os mais atentos dirão que o realizador Edward Zwick tinha obrigação de fazer melhor, porque já tinha conseguido um dos melhores filmes de Tom Cruise, "O Último Samurai", ou porque também já tinha assinado o interessante "Diamante de Sangue" com Leonardo Di Caprio, por exemplo, mas aqui perde-se em rodriguinhos desnecessários e acaba por não sair nada de interesse, mesmo para quem gosta de porrada pura e simples, sem muita conversa e sem muito assunto para pensar.



A tentativa de dar algum interesse ao mistério do passado de Jack Reacher, tentando meter-lhe uma filha pelo meio, pode dar algum assunto durante um bocado, mas antes do meio do filme, já toda a gente percebeu onde é que a história vai parar e tudo serve apenas para Danika Yarosh (Samantha) ir espalhando o seu charme adolescente.


Não é com adaptações destas que a produtora vai recuperar o investimento feito nas histórias originais - de que eu não gosto particularmente, mas que só conheço duas ou três, já nem me lembro! Ainda por cima, na sequência de uma primeira tentativa (muito) bem sucedida, o que faz com que esta segunda tentativa seja ainda mais decepcionante.