segunda-feira, maio 07, 2018

O "FILME NOIR" TEM FUTURO?

CRÉDITOS COMPLETOS

"Anon" é um filme desconcertante em (quase) todos os sentidos: a história está mais que vista (vem de "Admirável Mundo Novo" de H. G. Wells e, acima de tudo, de "1984" de George Orwell); é nitidamente um "série B", de orçamento limitado e sem recursos para efeitos especiais e outros subterfúgios; já foi filmada inúmeras vezes (de "Relatório Minoritário" à série de TV "Sob Suspeita") e, no entanto, o realizador Andrew Niccol e a sua equipa de actores e técnicos, apresenta um produto interessante, um "filme negro" de ficção cientifica que tem o espectador na mão do principio ao fim, bem construído, bem dirigido, bem interpretado.

Num mundo cinzento, com colorido apenas ocasional, onde tudo está devidamente catalogado e identificado, o detective Sal Frieland (Clive Owen) é confrontado com uma série de crimes cometidos por uma mulher não identificada, interpretada por Amanda Seyfried, uma falha no sistema que irá provocar um terramoto numa sociedade onde tudo está etiquetado e devidamente colocado no seu lugar.


E se contado assim, nada parece realmente original, a verdade é que o filme tem um ritmo muito próprio e uma história desenrolada com desenvoltura - apesar de sem pressas, porque não é da acção e da velocidade que o filme é feito. Se é verdade que "Anon" não é uma obra prima do cinema, não irá para a lista dos filmes da vida de ninguém, também é verdade que são duas horas de entretenimento, feitas não só a pensar na bilheteira, mas acima de tudo a pensar em divertimento de qualidade.


"Anon" é mais que uma tarde bem passada no cinema. É um filme interessante, que merece ser visto com atenção. Recupera o sentido do termo "femme fatale" e, apesar de ser nitidamente passado em ambiente de ficção cientifica, é também o que já se chamou "filme negro", é um thriller muito bem construído, que, apesar de não fazer do mistério a sua principal arma, tem suspense e mantém a plateia atenta ao ecrã com facilidade.


Clive Owen e Amanda Seyfried fazem mais do que lhes compete. Empenham-se e são dirigidos com mão segura por Andrew Niccol - que não é propriamente um ignorante na arte da realização e da escrita de argumentos: idealizou, por exemplo, o "Terminal de Aeroporto" para Steven Spielberg e fez "Nómada" ou "Gattaca". O principal problema de "Anon" será as inúmeras referencias que muitos espectadores irão encontrar, remetendo-os a obras anteriores, cinematográficas ou não.


Não sendo o mais original dos filmes, é, apesar de tudo, puro entretenimento de qualidade, pelo menos para aqueles espectadores que não se deixarem dominar por todas as pequenas coisas que irão encontrar a cada passo. Quem se deixar levar sem cinto de segurança, vai ter um passeio bem divertido, um thriller "B" sem preconceitos.