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Poucos realizadores conseguem captar o país profundo com a intensidade que ele merece. Dois filmes vieram-me à memória durante este "The Levelling": "Despojos de Inverno", de Debra Granik, e "Vale Abraão" de Manoel de Oliveira, mas podiam se alguns outros. Cada um à sua maneira, contam histórias de pessoas e lugares onde não há histórias. Filmes de tal dimensão, onde até os silêncios fazem doer.
"The Levelling" é a estreia da realizadora e argumentista Hope Dickson Leach nas longas metragens. É uma história da Inglaterra rural, da relação entre pai (David Troughton) e filha (Ellie Kendrick) e de como uma morte obriga a segunda a regressar à terra natal, enfrentando o primeiro, que odeia. Enquanto vai percebendo o que sucedeu ao irmão (Joe Blackmore), Clover tem de refazer as relações conturbadas com o progenitor.
A morte é a grande niveladora do drama da veterinária Clover. O filme começa com alguém a dizer-lhe do sucedido e perguntando "posso ajudar nalguma coisa?". Ao que a jovem responde "pode fazer com que seja o meu pai em vez do meu irmão?". Estão lançados os dados para duas horas dum drama de tal intensidade, que o espetador quase nem consegue respirar. Não se pense em grandes aventuras. "The Levelling" tem tudo menos velocidade, apesar de espingardas e tiros estarem de certa forma presentes na ação. Este é um filme que se quer saboreado devagar, com lentidão, onde até as festas no cão demoram o tempo real, tão real como a vida no campo.
Hope Dickson Leach filma cada fotograma com tal paixão, que cada milímetro de fita pode ser transformado numa canção de amor ou de raiva, depende do ponto de vista. Os atores não representam apenas, incluindo os mais secundários, transformam-se no próprio personagem em cada instante e isso transforma o filme num hino dramático, tão contundente como um murro no estômago.
Não importa o que a Academia vai dizer em Março do próximo ano. Pode-se já antecipar, que estamos na presença de um dos melhores filmes ingleses do ano, seja qual for o reconhecimento público e oficial que mereça. Sob a direção de Dickson Leach, um grupo de atores exemplares dá-nos um vislumbre sobre a infelicidade, a morte e a redenção, numa quinta rural da Inglaterra que ninguém quer ver, ou que ninguém sabe ver.