domingo, abril 08, 2018

HONESTIDADE MULTI-CULTURAL

Expresso do Amanhã: CRÉDITOS COMPLETOS

"Snowpiercer" carrega na bagagem a novela de BD "Le Transperceneige" de Lob, Rochette e Legrand, o director sul-coreano Bong Joon-ho - conhecido por "The Host" -, referências explicitas a "Elyseum" e "District 9" e, finalmente, uma elenco multi cultural, que inclui o "Capitão América" Chris Evans, passa pela estrela asiática Song Kang-ho, a quem se juntam vários ingleses com Tilda Swinton em destaque.


O que esperar, então, de tamanho cocktail? É a pergunta que muitos farão neste ponto. E eu posso assegurar que "Snowpiercer" segura todas as pontas com brilhantismo, mesmo que, em determinadas alturas, os espectadores mais atentos tenham a natural reacção tipo "eu já vi isto!..." Bong Joon-ho dirige de forma segura um filme que mantém o ritmo e o interesse do principio ao fim, sem que para isso tenha realizado uma obra-prima para a posteridade.


Na raiz do argumento, está a eterna luta de classes e as desigualdades sociais. Mas partindo desse ponto mais que visto, o filme desenvolve-se num ambiente claustrofóbico e tenso, sempre com momentos de acção e tensão. É uma daquelas obras que mantém a plateia presa ao ecrã sem dificuldade, com várias interpretações de excelência e uma montagem que acaba por surpreender, já que vem orientada por um mestre em flops, Harvey Weinstein.


Depois duma tentativa falhada para inverter o aquecimento global, o planeta fica gelado e sem vida. Os poucos sobreviventes habitam um comboio sempre em movimento, que está dividido entre as carruagens da frente, onde vivem os mais ricos, e as carruagens de trás, onde vivem os mais pobres, alimentados a barras gelatinosas de proteína. E embora muitos possam torcer o nariz a esta descrição sumária, a verdade é que o filme vive de forma exemplar dum grotesco pós-apocalíptico, que faria inveja ao próprio Philip K. Dick.


Tilda Swinton dá lições de interpretação - representado o que poderia ser uma Margarete Thatcher de ficção cientifica -, seguida de todo o elenco em grande esplendor. Na sua raiz mais profunda, "Snowpiercer" é apenas um filme sobre a luta entre bons e maus - aqui representados por pobres e ricos -, mas na verdade é um belo entretenimento, que vale a pena ser visto de olhos bem abertos.


Se a forma como toda esta metáfora funciona não é original nem surpreendente, o filme vai buscar a sua força a um design apelativo, a um ritmo muito bem gerido  e a uma honestidade inquestionável - da parte de todos os intervenientes, desde o realizador aos actores e técnicos. Enquanto a Primavera não desponta e o frio e a chuva continuam a massacrar-nos, "Snowpiercer" é uma bela desculpa para enfiar as pantufas e ficar em casa em frente ao ecrã.