CRÉDITOS COMPLETOS |
"Automata" não é para quem tem pressas, tem de ser saboreado devagar, como aqueles caramelos que se vão derretendo na boca a pouco e pouco, residindo precisamente aí o supremo do divertimento. Sem que a história seja particularmente original, vive dum argumento consistente, que se vai desenrolando em crescendo, duma realização segura, mesmo que vinda das mãos de um quase novato, e de várias interpretações brilhantes, com Antonio Banderas á cabeça, num daqueles papeis "à Almodóvar", onde a exuberância é secundária, mas a consistência é fundamental.
Passado num ambiente pós-apocalíptico muito próximo de "Blade Runner", "Automata" conta a história da descida ao inferno de Jacq Vaucan (Antonio Banderas), perito de seguros, especializado em robôs que violam o protocolo de não se poderem alterar a si próprios. O estranho caso de um policia que abateu uma das máquinas, alegando que ela se estava a auto-modificar, vai levar o investigador descobrir segredos que deviam ficar ocultos.
Se têm filhos pequenos e gostaram da animação "Wall-E", podem encarar este "Automata" como a versão para adultos do filme da Pixar, só que mais negro, deprimente e duma violência de cortar a respiração, não apenas visual mas - e principalmente - pressentida. Jacq Vaucan está emocionalmente à beira do abismo quando a aventura começa e, de repente, arrasta consigo toda a plateia que fica a pairar no "nada" e em queda livre para as labaredas do Hades.
Escrito por três (quase) desconhecidos, o realizador Gabe Ibáñez, juntamente com Igor Legarreta e Javier Donate, "Automata" podia ter seguido o caminho mais fácil, mas apesar de todas as referências óbvias, decidiu que uma história deve contar-se ao seu ritmo próprio e que todos os pormenores contam. Por isso desenrola-se à sua velocidade muito particular, demorando o tempo que é necessário, sem pressas e sem acelerações. É como é e como tem de ser ou, como diria o ditador António Oliveira Salazar: "está bem assim e não podia ser de outra maneira".
Não restam dúvidas que existem aqui inúmeras incursões a outros elementos conhecidos: Isaac Asimov, Philip K. Dick e "Blade Runner", até mesmo Spielberg e o seu "AI", no entanto nada disso altera um milímetro da consistência e do brilhantismo de "Automata", basta que o espectador deixe o filme derreter-se devagar, se deixe arrastar para o abismo e, quando estiver mesmo à beira do precipício, decida saltar. É a queda no vazio da própria existência.
Sem comentários:
Enviar um comentário