segunda-feira, fevereiro 29, 2016

FASCINADO POR PSICOSES

Alfred Hitchcock filmou mais de 50 longas-metragens, o que faz dele um dos mais produtivos realizadores de cinema de Hollywood - epíteto injusto para as suas origens inglesas. Nestas condições, quando queremos fazer uma pequena lista de filmes (chamados) obrigatórios, será quase impossível obter consenso.


Esta seleção de filmes não tem nada a ver com a opinião generalizada de técnicos ou críticos. Baseia-se exclusividade no meu gosto pessoal e nela vão constar enormes êxitos de bilheteira, lado a lado com enormes falhanços comerciais.

Chamada Para a Morte (1954)

Na estreia, "Dial M for Murder" foi apresentado em 3D (?). Hitchcock tentava aderir às novas tecnologias e embrenhava-se a brincar com a profundidade.


É um dos filmes em que a palavra "suspense" é levada às últimas consequências.
Janela Indiscreta (1954)

Adoro espreitar - e, vendo bem, quem não adora? Se se for guiado por Hitchcock, melhor! Talvez seja por isso que "Rear Window" teve tanto sucesso.


E depois, tem a melhor Grace Kelly e o melhor James Stewart, dirigidos pelo que Hitchcock sabe fazer de melhor: brincar com o espetador.

O Terceiro Tiro (1955)

"The Trouble With Harry" é o meu Hitchcock favorito, por muito que me acenem com outros argumentos.


Aqui Hitchcock leva ao extremo o seu humor corrosivo - daquele que não desperta gargalhadas, mas faz sorrir com gosto -, a sua noção de suspense e de imprevisibilidade. Pode não ser o Hitchcock mais famoso, mas tem o Hitchcock todo!

Psico (1960)

"Psycho" é o Hitchcock mais citado, aquele que faz as pessoas correrem para as salas de cinema.


Foi talvez o seu maior êxito comercial  - ou próximo disso - e ajuda os mais novos a perceber porque é que todos os filmes de terror, teem uma uma miúda retalhada num chuveiro.

Os Pássaros (1963)

 "The Birds" é uma surpresa para as gerações mais novas - às vezes no bom, outras no mau sentido.


Sem a Electric Light and Sound ali ao lado, os meios técnicos para a criação de efeitos especiais era muito limitada e tinham que ser produzidos "na hora" e de forma artesanal. Os mais preconceituosos acham-no "primário", os mais inteligentes surpreendem-se e divertem-se com a infantilidade.

Perigo na Noite (1973)

"Frenzy" é o regresso a casa do americano. Hitchcock volta a Inglaterra para aterrorizar Londres. O longo, lento e horrível estrangulamento de Brenda, ficou para a história do cinema.


É o único filme do realizador que tem nudez explicita. Corpos de mulheres nuas aparecem por todos os cantos da cidade, a boiar no Tamisa e perdidos em pensões de má fama.

quarta-feira, fevereiro 24, 2016

TUDO O QUE NÃO TEM



Quando escrevi aqui sobre "El Secreto de Sus Ojos", não tinha visto este "Secret In Their Eyes", nem sabia sequer que ele existia.


Tudo o que foi dito sobre o filme argentino, tem que ser retirado nesta versão americana, sem chama, sem alma, apesar de ter custado muito mais dinheiro.


Seria de esperar mais, muito mais, de um elenco que conta com Chiwetel Ejiofor, Julia Roberts ou Nicole Kidman, mas tudo não passa de uma má cópia do original.


A paixão não tem química, os atores arrastam-se durante (o que parece ser) um tempo infindável, nada funciona e Billy Ray não sabe o que há-de fazer com as câmaras, para além de andar atrás de vedetas completamente desinteressadas do que estão a fazer.



Este filme é uma completa perca de tempo para o espetador e um enorme desperdício dinheiro para a industria americana - no mesmo sentido em que o original argentino, faz muito mais com muito menos.

sábado, fevereiro 20, 2016

SEXPLOITAITION EM FORNO DE LENHA



"24 Exposures" é a prova de que não se deve abordar um filme já carregado de preconceitos. O género "sexploitation" é um prato (quase) tipicamente italiano e, tal como uma boa pizza, deve ser cozinhado com o requinte dum bom forno de lenha, sob pena de saber a micro-ondas.


E um bom forno de lenha é precisamente o que tem o argumentista e realizador Joe Swanberg, que com pouco dinheiro, não fica nada a dever ao melhor Jesús Franco ou ao melhor Joe D'Amato, misturando de forma brilhante nudez e crime, sexo e sangue.



"24 Exposures" não tem dinheiro, mas tem tudo o que é preciso para pegar em mulheres nuas e cenas eróticas, regá-las com molho de tomate e criar um excelente entretenimento, um cocktail do melhor de Jean Rollin com o melhor Tinto Brass.


Como não tem preocupações de estilo, não pretende fazer nenhuma declaração de originalidade cinematográfica, Joe Swanberg deixa os atores em paz na sua evidente incompetência, nervosismo e falta de experiência.



É preciso tanta nudez feminina para fazer este filme, ao ponto de já lhe terem chamado "soft-core porn"? Talvez não... Mas numa segunda perspetiva, porque não? Se a história é passada no mundo das belas modelos fotográficas, o que é que há de mais erótico, que despir uma jovem apetecível, excitantemente vestida de lingerie vermelha - ou preta, ou branca...?



E depois da cena erótica, porque não retalhá-la em pedaços e deixá-la para o detetive deprimido - também ele com problemas eróticos em casa - vir a descobri-la e desembrulhar a meada do crime?
É por isso que o despretensioso "24 Exposures" vale a pena. Porque não tem intenções de provar nada, demonstrar nada, exercitar nenhuma mente iluminada. Sexo, nudez e sangue. É tudo o que é preciso.

domingo, fevereiro 07, 2016

MIGALHAS DE PERFEIÇÃO



 "Bridge of Spies" junta migalhas do que Hollywood tem de melhor: Steven Spielberg e Tom Hanks. Não é a primeira vez que o primeiro se mete no mundo da espionagem (lembram-se de "Munique"?); nem é a primeira vez que o segundo faz de negociador implacável (lembram-se de "Jogos de Poder"?). Não é a primeira vez que trabalham juntos (lembram-se de "Terminal"?) e, esperemos, não será a última.


Ao contrário de "Munique", em "Bridge of Spies" marca-se uma linha clara entre bons e maus e nunca são confundidos, nos métodos e nas intenções. Há os que lutam pela justiça e pela liberdade e há os outros, os que estão contra o mundo ocidental e representam todos os ideais a que temos de nos opor. Mas nem isto é novo em Steven Spielberg. As coisas devem ser claras e devemos sempre saber de que lado estamos.


Mas o advogado James B. Donovan (Tom Hanks) está longe de ser um Indiana Jones da guerra fria. Se as circunstâncias merecem métodos menos ortodoxos, pois que sejam usados! E o facto de o filme ser baseado numa história verídica, confere-lhe alguma credibilidade, mesmo nos momentos mais improváveis.


"Bridge of Spies" tem Spilberg ao nível do melhor "Cavalo de Guerra" e Hanks ao nível do melhor "Cast Away", por isso está tão perto da perfeição que até doí! O realizador faz o que sabe melhor: dramatizar, impor o ritmo; o actor faz o que sabe melhor: representar. O filme tem o peso e a medida perfeitas, onde cada um sabe a parte que lhe compete e ninguém interfere com o trabalho do outro.


Salvo algumas raras exceções, nem Spielberg nem Hanks são gente sem sal. "Bridge of Spies" é um filme bem temperado, com a dose certa de açúcar e pimenta. Nem enjoa de tanto doce, nem incomoda de tanto picante. A guerra fria já lá vai há décadas e os inimigos agora são outros. É maravilhoso recordar os tempos em que as coisas eram bem mais claras e as linhas estavam bem mais definidas.

sábado, fevereiro 06, 2016

DUMA PONTA À OUTRA



"Spotlight" pega-se numa ponta e desenrola-se todo até à outra ponta sem parar. Hoje em dia, isso já é muito para um filme. Os amantes da teoria da conspiração vão ficar algo desapontados com a falta de acção, mas os outros vão entusiasmar-se com a história - ela própria, sem subterfúgios - que se vai desenrolando à sua frente.


Claro que, muitas vezes, nos vem à memória outras referências como "Os Homens do Presidente", por exemplo. Mas "Spotlight" não merece. Lembramos-nos ainda de outros filmes. de ficção, como "Capricórnio Um" ou "Os 3 Dias do Condor", mas, mais uma vez, é uma injustiça.


"Spotlight" não procura criar emoções no espetador, limita-se a seguir um grupo de jornalistas que vai desenrolado uma história complicada. Nada na realização nos faz tomar partido, e o resto são questões morais, com os habituais nós jurídicos.


O filme começa e acaba sem que nos tenhamos apercebido que passaram duas horas, tal é a competência de todos os envolvidos, actores, realizadores, editores. Este é um grande trabalho de equipa, como devem ser todos os filmes, em que cada um sabe a sua parte e desempenha-a com perfeição.

quinta-feira, fevereiro 04, 2016

VER COM OLHOS DE VER


 

A maior dificuldade em fazer filmes sobre adolescentes está no facto de, primeiro, se cair no moralismo idiota, tratando os adolescentes como criminosos incontroláveis ou vitimas indefesas; segundo, fugir para o puro drama sem sentido, tratando os adolescentes como seres ao sabor de emoções que os adultos não compreendem.


"Suicide Room" tem a vantagem de ver o mundo pelos olhos dos adolescentes, tal como os adolescentes - pelo menos alguns - o vêm, sem tentar que o espetador se aproxime ou se afaste dos personagens. Conta uma história dramática, tal como as histórias dramáticas devem ser contadas: com drama e emoção.


A realização é pura e dura tal como a vida dum adolescente. Não faz concessões ao politicamente correto, mas também não tenta o seu contrário. Vai seguindo a acção conforme ela se desenrola, e deixa que o espetador siga as suas próprias emoções.


Às vezes o excesso de filmes americanos ou com apetência americana, mesmo feitos noutros países, faz-nos esquecer da simples filmografia europeia, que tem uma vida própria e uma forma própria de ser (europeia). A Polónia - os países de leste em geral - tem uma identidade muito pessoal de fazer cinema. Suicide Room é um excelente exemplo, nada ficando a dever a Andrzej Wajda ou Krzysztof Kieslowki.


segunda-feira, fevereiro 01, 2016

TANGO(S) ARGENTINO(S)




Há filmes que nos caiem no colo por acaso e depois nunca mais saiem. Foi o caso de "El Secreto de Sus Ojos", que fez parte da sessão da noite de sábado, na televisão.


O filme nunca precisa de ganhar muita velocidade para manter o espetador interessado. Vai com calma, colecionando dramas. tanto podendo ser um romance tradicional como um policial simples. Há crime e mistério, há tensão jurídica, mas há também paixão e amizade. Tudo na medida certa.


É verdade que sendo um filme de baixo orçamento - pelo menos para os padrões hollywoodescos - não tem a agilidade contabilística das grandes produções americanas. Mas isso nunca lhe retira interesse e, num certo ponto de vista, dá-lhe consistência emocional, já que não desperdiça recursos, concentrando toda a energia no que é importante.


Às vezes pode parecer que não tem o golpe de rins de outros filmes para surpreender e fazer reviravoltas de argumento, mas na verdade tem a inocência, o que acaba por lhe conferir toda a credibilidade.


Não é só um grande filme, bem realizado e bem interpretado. É um tango argentino ao nível do melhor Astor Piazzolla, que nos faz dançar com o par mais bonito da sala.